sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Souza, Fluminense e a estrutura tática


É o que tento explicar desde 2008.


O problema do Grêmio não é propriamente o Souza, assim como, no Fluminense, não é propriamente o Deco.


O Deco, para futebol brasileiro, é craque. Mas um bom time não se forma com 11 craques. Um time com 11 craques pode funcionar menos que um time com 1 craque e 10 operários.


Questão de mecânica de jogo.


Um time mecanicamente perfeito com 10 craques e 1 operário pode sofrer muito mais com a perda do operário do que com a do craque.


Sem o Deco, o Fluminense tinha o Conca na melhor fase da carreira, talvez. Fernando Henrique; Leandro E., Gum e Andre Luis; Mariano, Diogo, Diguinho, Conca e Julio Cesar; Emerson e Fred (Washington). Cada um fazendo sua função. Era um time "perfeito". E todo mundo sabe que os zagueiros são medianos, Diogo saiu daqui escurraçado, Mariano perambulou por vários times e não se firmava, tendo quase saído do próprio Fluminense. E ainda assim formaram um time excelente.


Um dia o Fred se machucou. Entrou o Washington e o time continuou bem. Característica. A estrutura tática manteve-se a mesma. A chegada do Deco fez com que ele entrasse no lugar de um dos zagueiros. Mexeram na estrutura tática. Muricy tentou remediar, quando da lesão do Emerson, voltando com o terceiro zagueiro e jogando com 6 no meio. A estrutura tática continuava modificada. E continua. Daqui a alguns dias, o Emerson volta. O que o Muricy vai fazer? Provavelmente tirar um zagueiro, novamente. O correto seria transformar o Deco em Diguinho ou tirá-lo do time. Mas duvido que o faça.


Em 2008, o Grêmio, até meio sem querer, acertou um 3-5-2. Com o Roger, tínhamos um time extremamente dependente das condições do Roger. Era só ele que fazia gols. Ele participava de todos os gols. Um dia o Roger saiu. Achei que estava "tudo acabado". Mas aí veio o Tcheco e, por incrível que pareça, a entrada dele significou uma melhora brutal no coletivo. Todos passaram a jogar bem, o time passou a jogar bem. Mecanicamente passou a funcionar.


Com Victor; Léo, Pereira e Rever; Paulo Sérgio, Rafael Carioca, William Magrão, Tcheco e Helder; Perea e Marcel era líderes com boa folga no campeonato. Até que vieram dois jogos. Grenal da Sulamericana e Grêmio e Flamengo, no Rio. Dois jogos em que, efetivamente, o Souza apareceu bem. Antes disso, ele era o 12º jogador. Entrava sempre no segundo tempo no lugar do Perea, em geral, juntamente com Makelele e Reinaldo e o time crescia. E o Souza ia bem. Eu gostava do que via.


Aí no fim de um desses dois jogos o Souza foi Deco. Roth disse que teria que achar um lugar para o Souza no time. A má fase dos nossos alas pela esquerda fez com que ele fosse testado ali. Não rendeu. Depois, o Magrão se machucou. Makelele era a opção natural. Sempre entrava na do Magrão, quando necessário. Roth escolheu o Souza e mexeu na estrutura tática do time. A partir dali não nos recuperamos mais e perdemos o título.


Entendam, de uma vez por todas, o Souza por si só não é o grande problema do time de 2008, de 2009 ou de 2010. Nem o Deco é o problema do Fluminense. A utilização dele sim. Foi mal utilizado. Está sendo mal utilizado. A situação é irreversível. Não há como tirar dele no Grêmio o status que ele conquistou não sei porquê.


Uma estrutura tática pode não agüentar um campeonato todo, mas isso não significa que se deva altera-la radicalmente da noite para o dia. Principalmente, no momento em que esta estrutura está dando os melhores resultados. Roth o fez. Muricy está o fazendo. O Grêmio de 2008 não se salva mais. O Flu de 2010 ainda tem tempo. O Grêmio de 2010 tem solução ou, pelo menos, remédio. Do Souza eu desisti. Como ala ou meia extremo ele poderia render. Mas, repito, a situação dele me parece irreversível pelo status que ele atingiu.


M-E-C-Â-N-I-C-A. Não é por acaso que existe aquele jogador de uma temporada só. O jogador de um esquema só. O jogador de um time só. O jogador que só rende com um técnico. O futebol é menos simplista do que parece.


quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Que o Renato não repita o Silas



Um momento em especial: Santos e Grêmio, primeiro tempo, na Vila Belmiro. Era uma situação extraordinária. Semifinal de Copa do Brasil. Estávamos repletos de desfalques. Ainda assim protagonizamos naqueles 45 minutos talvez a melhor atuação da era Silas. Um time todo remendado que soube neutralizar as principais armas do Santos. Na segunda etapa, voltamos com uma postura diferente. Culpa também do Santos. Mas sem levar em conta o que aconteceu depois naquele mesmo jogo, Silas nunca mais repetiu aquela tática que apesar dos pesares, podemos considerar, deu certo. Como um dia li, por vezes o Silas acertava, mas parece que não entendia como e porque o fazia. Resultado? No jogo seguinte, os velhos problemas se evidenciavam.

Com o Renato, tivemos um alento. Teve pouquíssimo tempo para trabalhar e conseguiu montar um time. Com a frase “um time começa a ser montado pela defesa” ganhou bastante confiança da minha parte. E não é balela. Porque, logo que chegou, mesmo que talvez circunstancialmente, ele abdicou da ofensividade, quando tinha dois centroavantes no banco – André Lima e Borges –, para dar uma ajeitada na estrutura defensiva da equipe, jogando com uma espécie de 3-6-1. Em um primeiro momento, teve êxito. Logo em sua “real” estreia (desconsidero o jogo da Sulamericana), foi fundamental na vitória sobre o Goiás por 2 a 0. Passou por alguns percalços, posteriormente, mas hoje soma cinco rodadas sem derrota.

No último sábado, um primeiro tempo de encher os olhos. Talvez a melhor atuação coletiva do ano. Um Grêmio desacreditado diante de um favorito ao título e superioridade do time gaúcho nos 45 minutos. A segunda etapa foi repleta de circunstâncias de exceção. O time de Renato voltou sendo encurralado pelo Corinthians e esperava por um contra-ataque para matar o jogo. Quem entrou em ação foi o árbitro, que inventou um pênalti e expulsou o zagueiro Vilson, comprometendo o jogo gremista. Inteligentemente, o Grêmio fez o que esteve ao seu alcance. Recuou-se e fez o possível para manter o resultado. Manteve.

Dizem que temos que aprender com os erros, mas agora é hora de Renato tirar lição do acerto. Hoje, Rochemback volta. Sai Ferdinando. Não sou fã do jogador ex-Avaí, porém, o volante foi fundamental ao lado de Adilson no jogo do Pacaembu. Não individualmente, mas coletivamente. A defesa teve a proteção que não vinha tendo há muito tempo. Quem segue no time é Souza, que já está há quase 10 rodadas começando as partidas e segue comprometedor. Nos últimos dois jogos, foi importante. Mas defensivamente. Questão de posicionamento. E só. Do meio para a frente, apesar de ter “dado” um gol para Borges contra o Corinthians, Souza continua muito mal. Erra demais.

Outra questão fundamental é a utilização de Douglas. Com Renato, ele vem crescendo há muito tempo. A implicância não deixava alguns verem, mas o meia hoje é o “craque” do time. Sem ele, o Grêmio não consegue manter a posse de bola e se torna extremamente previsível.

Ferdinando, Adilson, Rochemback e Douglas. É o caminho. Não vejo um fator que sugira perda de qualidade com a entrada de Rochemback no lugar de Souza. Pelo contrário. Mais proteção à defesa e mais liberdade para Douglas criar. Que Renato perceba que está muito perto de acertar. Basta um detalhe.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Hoy no me voy para México

Malditos Menudos. O som do apito do árbitro ainda escorria pela cartilagem dos seus ouvidos e aquela musiquinha que a moça tantas vezes lhe fizera ouvir, sem maior razão para tanto, agora vibrava junto com o estrilar do sopro do homem de preto. Quem o visse de perto notaria que seu suor espesso era como a baba dos melhores cavalos que ofegavam com as bocarras escancaradas após os páreos disputados nos hipódromos dos jardins.

Seus olhos eram os de um doente terminal vagando pelos corredores do nosocômio, desanimadamente abertos a buscar uma aspiração talvez inatingível. Fixava a vista na marca do pênalti, no círculo meio desbotado sobre a grama, e imaginava ali a bola que logo colocaria. Pensava nisto. E pensava nela. Na mulher que desejava, não na bola. Não que o redondo da bola lhe trouxesse à mente a figura da moça, que estava enxuta, mas porque em seus conceitos parecia óbvia a relação entre as duas coisas – o tiro certeiro, a glória, as mãozinhas dela batendo uma na outra e aplaudindo. E ela mais próxima dele cada vez que as palmas das mãos se juntavam para fazer plat-plat-plat.

Porque estava naquela fase da admiração em que, depois de se aproximar sem segundas intenções, o sujeito descobre que quer algo mais e precisa encontrar uma maneira de contornar a própria amizade que já criou. Malditos Menudos. Malditas tardes em que, infantil, se tornara confidente dela e tão necessário a ponto de fazer uma relação mais profunda ser temida – já que pondo tudo a perder. Maldita a vida de ser a esperança do time local e estar num jogo em que nada acontece, a bola não vem e o nervosismo aumenta conforme os raios cósmicos cruzam o campo e os minutos se adiantam.

Vezemquando procurava ela com a esquina do olho nos pedaços que cercavam o gramado e encontrava sua expressão reconfortante, de como se nada estivesse acontecendo. Não uma indiferença. Antes, uma segurança. Uma suavidade que nem os carrinhos inimigos conseguiam borrar. Então ia às arestas internas do corpo e encontrava, ali, naquela última dobrinha entre o fígado e alguma coisa que fique próxima do fígado, um miligrama da substância mística que dá ao homem mais forças do que ele normalmente tem.

Mas, aos quarenta e tantos minutos do segundo tempo, quando o sujeito recebe um lançamento, tenta virar para o gol, embrenha-se entre os marcadores e é derrubado, e é derrubado para ouvir o apito de um pênalti que pode mudar toda a história do jogo, e ouve esse apito sabendo que do outro lado está um goleiro que cobiça a mesma moça por quem tantas horas de sonho foram gastas, e sabe que este goleiro nada tem a perder – aos quarenta e tantos minutos do segundo tempo, quando tudo isso acontece, nem mesmo toneladas da tal substância mística impedem que os olhos entorpecidos com a luz como um leitor se entorpece diante de um parágrafo sem pontos finais, nem mesmo essas toneladas impedem que a distância entre as traves pareça absurdamente menor do que costuma ser.

E que o arqueiro surja como um gigante a tapar todo o quadrilátero do gol.

Precisava derrubar aquela bastilha com golpes de bico da sua chuteira. Um único golpe, na realidade. Conhecia o goleiro, o canalha, da forma como se conhece um meio-irmão distante. Cruzara com ele algumas vezes, em tempos idos, com outros objetivos e quando essas questões todas não importavam nem existiam. Lamentavelmente, a tarde agora não estava sendo sua. E mesmo a superioridade do seu time não significara para ele um bom futebol. Pouco fizera diante do goleiro tirano. Nada fizera, sabia, para impressioná-la. Agora, porém, havia o pênalti. “Hoy me voy para México / quiero estar con ella”, ressurgia, brigando com o ruído do apito, o maldito verso.

Pegou a bola.

Conhecia aquele campo e as suas irregularidades. Sabia que o cafajeste da camisa um não era de esperar chutes. Lembrou-se do que sempre ouvia do pai de um amigo, um uruguaio: os que jogam bola e treinam para isto não têm o direito de errar pênaltis. Basta chutar forte e no canto. Quem dizia isso, usando a voz do pai do amigo, era na verdade Hector Scarone – o maior artilheiro da Celeste Olímpica, que só errara um pênalti na vida. Errou não por perder para o goleiro: certa vez, ocorreu de atirar na trave - por descuido ou raiva divina, pois a Perfeição não é para os mortais.

Scarone foi campeão do mundo. Já ele, naquele campinho, observado pela mulher que mais queria e diante do homem que mais odiava, contentava-se com o júbilo de um dia só. Bateria forte e no canto. Tirar fuerte que ya está adentro. E não olharia para o goleiro. Não se desviaria em momento algum. Aninhando a pelota na marca dos onze metros, decidiu correr com a cabeça baixa. Por fugazes instantes suas ideias rabiscaram a hipótese de dar uma paradinha, prender a passada e confiar na quase infalível tendência do arqueiro de se jogar por antecipação. Mas não sabia dar paradinha e riu consigo mesmo por cogitar o absurdo.

Desconcentrou-se.

E, desatento, mirou os olhos do goleiro. Durou um segundo. Quiçá menos, mas ainda assim muito mais do que os cronômetros diriam. Durou a extensão de uma partida ou uma vida inteira. O temor jorrava das retinas do inimigo, estático e extático sobre a linha fatal. Voltou a confiança do batedor. Quanto ao goleiro: braços bem abertos. A fé irracional numa envergadura de Boeing 747. No entanto, atrás dele o gol crescia. O Boeing já era pequeno demais para tapar com suas asas a extensão de um retângulo de metal pintado de branco que se dilatava prometendo o gol, o gol, o gol.

Desatou a corrida. Um pé. O outro. O primeiro novamente. Pisoteava a grama em câmera lenta. Com aquele gol iria para seu México metafórico e teria o seu amor. De algum jeito. Nem que esperasse mais mil anos. Mas aquele gol garantiria que ela seria sua, e só sua, pois no mundo é preciso haver algum resquício de justiça e ele, afinal de contas, nunca pedira nada muito grandioso aos céus. O arqueiro não se definia. A distância para a bola se reduzia dramaticamente. O Boeing estacionado. E por fim já não havia como fugir da proximidade com a esfera e seu pé se revestiu de tijolos com a disposição de enterrar o camisa um nas redes.

A bola tomou o rumo de um canto e cortou a atmosfera.

Fechou os olhos. Esperou cego naquela solidão eterna de um microssegundo em que todo o bulício da cancha se confunde e até é possível decifrar uma vibração. Que a seguir virou vaia. “U” foi uma vogal muito repetida nos minutos seguintes. Virou-se para os companheiros – e na testa de cada um, marcada por ferro em brasa, ardia a mensagem dizendo que o goleiro pulou certo e alcançou a bola. As redes vazias eram o México inalcançável de todos os dias.

Ele, o artilheiro do time, errou o pênalti. E não pela primeira vez. As escrituras dizem que seu nome era Jonas, mas pode ser um erro de tradução.



(a foto que ilustra o texto é de EDUARDO COVALESKY e foi tirada na decisão por pênaltis do jogo Grêmio 0-0 Coritiba [4-2], válido pelo Brasileirão Sub-20, disputado em Santa Maria em dezembro de 2009)

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Acima de tudo, queremos raça!


Borges, Souza e Douglas. Pergunte a qualquer torcedor (não gremista, obviamente) se eles querem ter algum, ou até mesmo os três, no seu time. Sem medo de errar, 90% responderão que sim.


As qualidades técnicas desses três cidadãos são inquestionáveis.


Souza tem uma qualidade para bater na bola impressionante, faz muitos gols de longe, e bate falta como poucos no Brasil.


Douglas é um dos melhores passadores que temos por aqui, foi constantemente elogiado pela mídia especializada em todo 2008 e uma boa parte de 2009. No Corinthians, Ronaldo fenômeno chora a sua saída até hoje.


Borges é um artilheiro nato. Finaliza como poucos, se posiciona muito bem, foi artilheiro por todos os times que passou.


E agora eu lhes pergunto: porque esses três jogadores não deslancham no Grêmio? Falta de comprometimento com o clube e principalmente, falta de comando. São ótimos jogadores, mas em campo, não tem a vibração necessária para jogar no Grêmio.


Vejam por exemplo, Neuton e Adílson. Esses dois, não são grandes jogadores tecnicamente, mas se doam em campo como poucos. Vibram a cada lance conquistado, dão carrinho, soam a camiseta. É isso que queremos de Souza, Douglas e Borges.


Rodrigo e Hugo já foram, e se esses três não mudarem a postura, serão os próximos.


Jogar no Grêmio é diferente de jogar no São Paulo, Corinthians, Inter e etc. Aqui nós queremos muita vontade, queremos calção sujo de tanto dar carrinho. Queremos raça, porra!


Acordem medalhões, isso aqui é Grêmio!


Saudações tricolores!


domingo, 5 de setembro de 2010

“Eu estive no inferno”

Quando o último varredor do último degrau de arquibancada juntar o último copo plástico atirado ao chão pelo último torcedor que abandonou o estádio no final da última tarde de futebol do ano, nesse momento ele já terá a resposta para as questões existenciais que nos afligem por estes dias.

O gari hipotético poderia se chamar Janicleison. Ter quarenta e cinco anos. Estar há quinze sendo o tal último varredor. E, caminhando pelo concreto da cancha, ter descoberto que os riachos evaporados de LIBER indicavam não apenas o desperdício de dinheiro em sucos de cevada, mas também um caminho até os portais das viagens temporais.

Como o dinheiro é pouco e as milhagens dão cada vez para menos, seu Janicleison só conseguiria ir para o passado e com curta distância – apenas três meses e dois dias, estourando qualquer limite. Ele surgiria em algum ponto de Porto Alegre vestindo uma psicodélica roupa feita de papel laminado e procuraria o bar mais próximo para fazer sua DESCOMPRESSÃO de tamanha viagem.

Ao dar por si, seu Janicleison estaria agarrado a um copázio de cerveja verdadeiramente alcoólica, sorvendo um colarinho não tão branco quanto poderia estar, e mirando o futuro do qual veio com mais resignação do que qualquer um ao seu redor. Se o seu Janicleison for um sujeito de cabelo ralo, barba mal feita e olhos de um cinza líquido, eu o encontrei por acaso ontem.

Dizia ter acordado com o peito comprimido pela mesma depressão já sentida em anos que cria esquecidos para sempre, ido ao estádio e se colocado a coletar papéis e sacos plásticos que o vento da manhã quase veranista fazia alçar voo. Aí pisou em algo meio liso, escorregou, enredou-se num vórtice arroxeado e reintegrou-se diante de Zero Horas em cujas capas se lia que era sábado, 4 de setembro de 2010.

Seu Janicleison não sabia exatamente como se metera na enrascada que o fazia sugar o sumo dourado num ritmo incomum – às minhas custas –, mas trazia no fundo da voz a gravidade cavernosa de quem esteve diante do inferno e voltou. Observando os créditos do pay-per-view que subiam na widescreen do boteco, estampava na pele curtida um sentimento irrequieto muito diferente da felicidade moderada de quem ocupava as mesas contíguas.

Nosso varredor veio de um tempo sem ídolos nem perspectivas, aquela terra mítica também conhecida como Dia Seis de Dezembro. Ele garante que, naquelas lonjuras, Portaluppi está tão distante do Olímpico quanto Ipanema, enquanto Victor e Jonas se separam da Azenha por alguma distância medida nas milhas náuticas que pontilham o azul do Atlântico até o Velho Mundo.

No Caderno de Esportes, as notícias todas se questionam sobre a melhor tática a ser usada por Celso Roth diante de um time PAPUANO, e apenas duas páginas com caracteres rigorosamente contados estão dedicadas à crise que se abate sobre o Olímpico. O ponto que faltou representou o descenso ao escalão inferior do futebol nacional e os incômodos que uma Série B causa afastaram a chapa escolhida nas urnas para comandar o Grêmio em 2011.

Poucas horas depois da partida, os eleitos se adonaram dos microfones para enfatizar que não tomariam posse. O caos se instaurou imediatamente. Molotovs arrebentaram as vidraças do Olímpico e a Grêmio Mania teve saqueadas todas as suas camisas retrô da temporada 1995. Das de 2010, não houve registro de sumiço nos estoques. Alguém declarou à imprensa que as novas eleições seriam gerais, com candidatura e votação abertas a qualquer pessoa que mantivesse algum vínculo com o clube.

Inovadores, Douglas e Souza lançaram uma chapa em que seriam presidente e vice – não necessariamente respectivamente – e prometeram uma gestão absolutamente profissional. Começando pela concessão de salários polpudos aos ocupantes de cargos diretivos; no caso, eles próprios. Por falta de concorrentes, no dia em que Janicleison atravessou as camadas do tempo a “Chapa 4 – Driblando pelo Meio” despontava como favoritíssima na nova eleição.

A primeira medida seria usar o dinheiro da venda de Victor e Jonas para tentar repatriar Hugo.

Nesta altura, interrompi a palestra assustado e questionei se não haveria alguma solução. “Tem”, disse-me Janicleison. “Pra quem viu o que deu errado depois, é bem mais fácil corrigir”, garantiu. Continuou: “se me dessem duas semanas no Olímpico, eu mudava tudo. Mas tem que ser logo”. Pediu mais uma garrafa de cerveja, sempre na minha conta.

“Mas nós acabamos de recuperar um jogo contra o Botafogo, e até teve uma dose de glória. Saímos com dois gols contra e buscamos faltando cinco putos minutos pro fim”, desafiei. “Pois é, parceiro”, concordou ele com um ar condescendente – “em 2004 também”.

* * *

Janicleison não estava mais no bar quando voltei do banheiro. Ninguém sabia dizer aonde foi. Mas ele não era um bêbado contador de histórias, muito menos um delírio. Era o Profeta do Porvir. E eu deixei sumir. Nossa salvação nos tem escapado até quando parece palpável. Não podemos nos distrair.

Se não cairmos, é porque ele partiu na direção do Olímpico e em algum momento da próxima semana sentará para prosear com o Duda Kroeff. Torça para ser ouvido, Janicleison. Caso contrário, dê umas vassouradas nele.

sábado, 4 de setembro de 2010

Chegou a hora de o Jonas ser Forlán


Trata-se de mero devaneio deste que sugere, mas, diante da perspectiva que se tem para o jogo de logo mais, “fica a dica”. Cada vez mais fica evidente a dependência que temos em relação ao Douglas. Um jogador que nas últimas quatro ou cinco rodadas vem crescendo, sensivelmente talvez, mas crescendo. E os bons momentos dele coincidem com os melhores momentos do Grêmio recentemente. Depois de uma seqüência boa de jogos nas últimas partidas, veio a constatação da lesão no púbis e a ausência na partida diante do Botafogo.

Projeta-se um meio com Souza e Leandro. Caos. Leandro não é meia. Vez ou outra, emergencialmente, foi improvisado no São Paulo e chegou a jogar assim na segunda divisão japonesa. Teve sua melhor atuação recente, e não só pela assistência, diante do Atlético Paranaense, nos momentos em que jogou como uma espécie de ponta, caindo pela direita. Detalhe: quem fazia a função pelo meio, naquela oportunidade, era Douglas, o único jogador do plantel profissional com tal capacidade.

O problema nisso tudo é que Douglas saiu lesionado diante do Guarani e Renato optou por Leandro, fazendo parceria com Souza na meia-cancha e, por isso, imagina-se que dará seqüência a tal ideia. Ou não. É uma boa prova para as capacidades do treinador. Qualquer um percebe que o Grêmio não pode jogar como jogou no segundo tempo da última quarta-feira. Espero que o Renato, também. Souza é jogador de flanco. Ou como ala ou como meia-extremo e, por isso, ficamos com graves deficiências na articulação, não conseguimos manter a posse de bola e a tendência é um "Deus nos acuda".

Diante da inexistência de jogo pelo meio tanto com Leandro, quanto com Souza, chegou a hora de o Jonas ser Forlán. Como fez Tabaréz na Copa ao perceber a falta de um armador, poderia fazer Renato. Puxar o atacante com mais qualidade técnica para buscar jogo. Vale lembrar que o mesmo Jonas já o fez quando começou a carreira no Guarani. Alguns com quem comentei tal possibilidade rechaçaram-na alegando que Jonas não tem inteligência tática para tal, ou mesmo que anda “fominha” demais. Ao mesmo tempo, lembrei-os de que o próprio Jonas fez papel semelhante em determinando momento de um dos jogos contra o Goiás e foi razoavelmente bem.

Talvez o restante da estrutura tática da seleção uruguaia não tenhamos à disposição, mas neste setor de meio-campo a improvisação de Jonas me parece uma alternativa válida e que agregaria qualidade. Jonas seria um enganche, Leandro ou André Lima fariam companhia a Borges no ataque e jogaríamos com três volantes: Rochemback, Adilson e Maylson (Ferdinando). Assim, cria-se a possibilidade de liberarmos os Gabriel e Fábio Santos para atacar, sem deixarmos a defesa exposta. Pois bem, é claro, trata-se de um devaneio. Mais fácil – e, em relação ao meio com Souza e Leandro, mais prudente – seria Renato optar por Neuton e jogarmos com 3 zagueiros. Não seria de todo mal, mas continuaríamos com algum problema de criação pela falta do organizador. Por outro lado, significaria uma melhora defensiva, ao menos. Mais detalhes no próximo capítulo...

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Sou quem não te abandonou


Quarta-feira, 19h30 e time na zona do rebaixamento. Por esses três motivos, era de se esperar um público pequeno no estádio. Era, mas não foi. A direção diminuiu o preço do ingresso pela metade, e a torcida fez sua parte, 30 mil gremistas empurraram o Grêmio pra cima do Guarani.


Na primeira etapa o Grêmio foi muito superior. Fábio Santos, Vilson e Rochemback, o novo capitão, foram os destaques individuais. De pontos negativos, mais uma atuação beirando o ridículo de Souza, tá na hora dele sentir o gostinho do banco, a torcida já perdeu a paciência com ele, e agora, parece que a insatisfação também chegou a Renato.


O gol saiu aos 23 minutos na primeira etapa, Fábio Santos recebeu pela esquerda e cruzou a bola com maestria para Jonas, mestre Jonas, abrir o placar. O Grêmio até acabou fazendo o segundo gol, com Gabriel, mas foi anulado, erroneamente pelo bandeirinha.


No segundo tempo o Grêmio voltou muito devagar, o Guarani assustou, pressionou, mas não conseguiu tirar a vitória tricolor. Com esse resultado, o Grêmio saiu da zona do rebaixamento, e agora está em 16°, com 19 pontos.


Sábado é o Botafogo, no Rio de Janeiro, creio que um empate será um bom resultado, o time de Joel Santana vem embalado e está na 3ª colocação do Brasileirão. No meio de semana pegamos o Atlético-GO, em nossos domínios, e aqui, aqueles que nunca abandonam estarão lá, no cimento sagrado do Olímpico, para empurrar o time à mais uma vitória.


Força, Grêmio!


Serviço do Jogo:


Grêmio: Victor, Gabriel, Vilson, Rafael Marques e Fábio Santos; Adílson, Fábio Rochemback, Souza e Douglas (Leandro); Jonas e Borges (André Lima). T: Renato Portaluppi.


Guarani: Emerson, Rodrigo Heffner (Apodi), Fabão, Ailson e Márcio Careca; Maycon(Baiano), Renan, Paulo Roberto e Mário Lúcio; Rômulo (Ricardo Xavier) e Mazzola. T: Vagner Mancini.


Gols: Jonas, aos 23 minutos do primeiro tempo

Cartões amarelos: Rodrigo Heffner, Fabão e Fábio Lúcio (Guarani); Gabriel e Rochemback (Grêmio)

Local: Estádio Olímpico, em Porto Alegre. Data: 1º de setembro de 2010.

Árbitro: Wagner Reway (MT). Auxiliares: Paulo César Silva Faria (MT) e Fábio Rodrigo Rubinho (MT).